MINDSUP by Prof Denise Razzouk http://www.drmindsup.com
  • Home
  • Blog Economia e Saúde Mental em Pauta
  • Home English
  • Livros

Economia e Saúde Mental em Pauta​

Dia da pessoa com Esquizofrenia: o custo do estigma!

23/5/2019

0 Comentários

 

O dia da pessoa com Esquizofrenia é celebrado em 24 de maio. Todos os dias do ano ano são destinados para celebrar alguma causa. Mas, qual é a importância desta data?

A Esquizofrenia é uma doença mental! Sim, é uma doença mental e que não depende da vontade, inteligência ou do caráter da pessoa, nem do nível sócio-econômico ou da "neurose" das mães. Embora nem todas as causas da Esquizofrenia tenham sido totalmente elucidadas, sabe-se hoje que a Esquizofrenia é decorrente de uma alteração no desenvolvimento do cérebro desde do início do nascimento até meados da idade adulta. Ao contrário de outros órgãos do corpo, o cérebro humano demora, em média, de 15 a 20 anos para atingir o seu grau de maturação plena. Durante este período muitos fatores podem influenciar neste processo: desnutrição, infecções, deficiência de vitaminas, estresse excessivo, uso de drogas (principalmente, a maconha e a cocaína), problemas no parto, a não realização de exames e acompanhamento pré-natal durante a gestação da mãe e a idade paterna, dentre outros. Além disso, esta doença é fortemente relacionada aos fatores genéticos. Ter um parente próximo com Esquizofrenia aumenta muito o risco de ter a doença. 

Ao contrário do que se pode imaginar, uma pessoa com Esquizofrenia tem períodos de lucidez e episódios que duram semanas ou meses com sintomas psicóticos. Nestes episódios, as pessoas ouvem vozes que lhe dão ordens ou comentam seus comportamentos, e em geral, estas vozes não são nada agradáveis. Além disso, nestas ocasiões, estas pessoas podem ter alterações em como percebem a realidade, o que chamamos de alteração de julgamento (delírios) e elas podem sentir que estão sendo perseguidas por todas as pessoas ao seu redor. Existem outros sintomas além destes, mas este post não visa se concentrar neste aspecto. Mas, o mais importante é que estes sintomas cessam com as medicações psiquiátricas e que a pessoa recupera a capacidade de exercer suas funções vitais e sociais. 

Apesar dos sintomas psicóticos causarem muito sofrimento, talvez o maior sofrimento seja, realmente, após o "surto psicótico", quando a pessoa tenta ter uma vida normal. Em geral, nesta fase, múltiplas abordagens são usadas (intervenções psicossociais), com a participação intensa de psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais e outros profissionais, para que a vida destas pessoas e da família volte ao normal. A maior dificuldade, após um surto, é voltar a se inserir na sociedade, exercer sua profissão, voltar a estudar, a cuidar dos seus afazeres e ter uma vida plena. O principal obstáculo para esta volta é o estigma contra a doença mental!

O estigma nada mais é do que um conjunto de preconceitos e ideias errôneas aliadas a atitudes discriminatórias e agressivas contra alguém (Veja o vídeo do Prof Thornicroft sobre estigma). Em relação à Esquizofrenia, existem muitas ideias distorcidas, principalmente, a de que estas pessoas são perigosas, agressivas e incapazes de fazer qualquer atividade. E infelizmente, a mídia reforça estas ideias (Guraniero et al, 2012). 

Quais são as consequências e os custos do estigma contra a Esquizofrenia?

São duas as consequências: O não investimento em políticas públicas sociais e de saúde para o tratamento e prevenção da Esquizofrenia e perdas econômicas e sociais para a pessoa, a família e diversos setores da sociedade. Focarei nos impactos para a pessoa com Esquizofrenia e seus familiares.

Limitações na vida da pessoa com Esquizofrenia

A primeira limitação está na perda de oportunidades (Romeo et al, 2017), sejam elas relacionadas ao trabalho e renda, à inserção social (relacionamentos e networking) e ao acesso às possibilidades de desenvolvimento pessoal. Estima-se que apenas 1/5 das pessoas com Esquizofrenia no mundo conseguem um trabalho remunerado e que mais de 90% recebem benefícios sociais na Europa pela falta de oportunidade de trabalho!(Knapp& Razzouk, 2009). Pelo menos 50% das pessoas com Esquizofrenia relataram sentir-se discriminadas no ambiente de trabalho, em um estudo na Nova Zelândia. Só pelo fato de contar no trabalho que é portador de Esquizofrenia já seria um motivo para ser demitido (Sharac et al, 2010). Além disso, muitos familiares param de trabalhar para cuidar de seu parente com Esquizofrenia, levando a uma perda de emprego e renda. Há estudos mostrando que estas perdas chegam a 30% dos custos da Esquizofrenia! (Razzouk, 2017). Outros estudos mostram que 60% dos adolescentes que apresentam um episódio de Esquizofrenia não voltam a estudar e nem tem amigos e relacionamentos fora de seu convívio familiar e dos serviços de saúde! Menos de 10% chegam às Universidades. (Razzouk, 2017). 
Cria-se, então, uma barreira social, muitas vezes invisível ou disfarçada, que propicia um isolamento social desta pessoa e também de sua família.Esta barreira provoca uma grande desvantagem social e econômica!

Porém, a discriminação está presente em todos os setores, até nos setores da Saúde! Frequentemente, as pessoas com Esquizofrenia sofrem maus tratos ou são ignorados quando tem alguma doença física! Médicos e outros profissionais de saúde, muitas vezes, evitam atender estas pessoas, realizam menos exames físicos e laboratoriais e estas pessoas recebem menos tratamento do que necessitam! A expectativa de vida destas pessoas é de 20 anos a menos do que a maioria da população e por causas totalmente tratáveis como a Pneumonia, Diabetes, Hipertensão, etc!!!! (Razzouk, 2017). Mas, o preconceito não pára nos médicos generalistas ou de outras especialidades. Em um evento em Berlim sobre estigma de doença mental - 3rd International German Forum “What matters to people – global health and innovation", coordenado pela chanceler Angela Merkel, que eu tive a oportunidade de participar, fiquei surpresa que uma das participantes que era portadora de Esquizofrenia relatou que o maior preconceito que ela havia sofrido era oriundo dos próprios psiquiatras!!!! Sim, há muito o que se fazer em relação ao estigma!!!


Em tempos de Desenvolvimento Sustentável, de não deixar "ninguém para atrás", combater a pobreza, a desigualdade....resta a pergunta - o que está sendo feito para combater o estigma e estabelecer políticas públicas sociais, educacionais e de saúde para melhorar a inclusão e qualidade de vida destas pessoas? Algumas iniciativas já existem (ABRE, Programa INSERIR-PROESQ, UNIFESP,  PROJESQ-IPQ USP), mas são necessárias ações mais globais que atinjam os vários setores da sociedade. 

Vou deixar um video com quem entende do assunto e vai te explicar como é ter Esquizofrenia. Jorge Assis relata neste video a sua experiência com a doença e como fez para superar os desafios que a doença traz: https://www.youtube.com/watch?time_continue=29&v=16q6NbbeeoY
​




Sugestões de leitura

GUARNIERO, Francisco Bevilacqua; BELLINGHINI, Ruth Helena  and  GATTAZ, Wagner Farid. O estigma da esquizofrenia na mídia: um levantamento de notícias publicadas em veículos brasileiros de grande circulação. Rev. psiquiatr. clín. [online]. 2012, vol.39, n.3, pp.80-84. ISSN 0101-6083.  http://dx.doi.org/10.1590/S0101-60832012000300002.

Romeo, R, Thornicroft,G, Mc Crone, P. The economic impact of mental health stigma. In: Razzouk, D. Mental Health Economics: The costs and benefits of psychiatric care. Springer International Publishing Cham, 2017, pp401-413.


Knapp,M, Razzouk, D. Costs of schizophrenia. Psychiatry, 2009; 7:1

Razzouk, D. Burden and indirect costs of mental disorders. In: Mental Health Economics: The costs and benefits of psychiatric care. Springer International Publishing, Cham, 2017 pp 381-391.



Sharac, J,  Mccrone,P,  Clement, S, Thornicroft,G.The economic impact of mental health stigma and discrimination: A systematic review.
Epidemiologia e Psichiatria Sociale 2010; 19:03:223-232. DOI: 10.1017/S1121189X00001159


0 Comentários

Seu comentário será publicado após ser aprovado.


Enviar uma resposta.

    Prof Dra Denise Razzouk

    Psiquiatra e professora universitária, com pós-doutorado em Economia da Saúde Mental. 

    Arquivo/archives

    Outubro 2020
    Abril 2020
    Maio 2019
    Outubro 2018
    Setembro 2018
    Agosto 2018
    Junho 2018
    Maio 2018
    Abril 2018
    Março 2018
    Fevereiro 2018
    Janeiro 2018
    Dezembro 2017
    Novembro 2017
    Outubro 2017

    Feed RSS

                                                      Minds Up by Prof Denise Razzouk    http://www.drmindsup.com    email drmindsup@gmail.com                     
  • Home
  • Blog Economia e Saúde Mental em Pauta
  • Home English
  • Livros