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Economia e Saúde Mental em Pauta​

Custo-efetividade de tratamentos em Saúde Mental: Serviço público de saúde x paciente e família x sociedade

7/3/2018

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 Nos posts anteriores, eu expliquei o valor da eficácia e da efetividade do tratamento. Eficácia se refere à capacidade de um tratamento produzir um determinado efeito (melhora de sintomas, por exemplo). A efetividade se refere à manutenção deste efeito em contextos reais e heterogêneos. Por exemplo, se uma medicação é eficaz para diminuir os sintomas depressivos, a sua efetividade pode variar se o paciente não tomar a medicação adequadamente, produzindo um efeito menor do que a medicação seria capaz de proporcionar. No custo-efetividade de um tratamento, queremos saber o quanto pagaremos por um efeito (benefício) em um contexto real. O custo-efetividade é sempre uma comparação entre as alternativas que tem eficácia comprovada. Queremos saber qual delas é mais vantajosa em termos de custos e benefícios.

Isto parece simples e intuitivo porque a maioria das pessoas ao comprar um serviço ou produto pensará nos benefícios que alcançará e o quanto vale à pena pagar por ele. Porém, o custo-efetividade de um tratamento engloba outras questões menos óbvias. 

A forma de se mensurar o custo de um tratamento varia com a perspectiva. Na perspectiva do SUS, o Ministério da Saúde está interessado em quanto ele desembolsará para a disponibilização de um tratamento. Porém, este valor que o Ministério paga (reembolso) é só uma parte dos custos reais de um tratamento. Mas, se considerarmos uma perspectiva do provedor público de serviço local, as Prefeituras e os Estados também arcam com uma parte dos custos e estão interessados nessa fração. Isto pode causar problemas na gestão de serviços se a inclusão de novas tecnologias em saúde só levar em conta os reembolsos federais e ignorarem os custos reais que recaem nas Prefeituras e Estados.


Os custos do tratamento vão além dos custos dos provedores de saúde. Tanto o paciente quanto seus familiares também arcam com os custos do tratamento (denominado custo informal), seja com os custos com o transporte, medicamentos, cuidadores, adaptações estruturais da casa às necessidades do paciente, perda de horas de trabalho, desemprego e outros custos associados. Então, pela perspectiva do paciente e dos familiares, os custos que interessam são outros. Se ampliarmos esta perspectiva para toda a sociedade, os custos são ainda maiores e atingem outros setores. Por exemplo, no caso de uma pessoa com problemas com o álcool que dirige embriagada e causa acidentes e mortes, existem vários custos denominados custos indiretos) que recaem sobre outras pessoas. 

Quando realizamos um estudo de custo-efetividade é necessário determinar sob qual perspectiva estes custos serão mensurados. Dependendo da perspectiva e dos custos incluídos no estudo, um mesmo tratamento pode ser custo-efetivo em uma delas e não ser em outra. Imaginemos um caso em que  a pessoa tem uma psicose e tenha um comportamento agressivo com os familiares. Qual o tratamento será mais custo-efetivo?

A resposta é : Depende! Se for um estudo com a perspectiva do SUS em que os custos dos serviços e das medicações são incluídas, os benefícios serão analisados, em geral, por medidas de eficácia clínica (redução de sintomas psicóticos, por exemplo). Caso não hajam diferenças entre a eficácia entre duas medicações, a que for menos custosa será mais custo-efetiva. Se a perspectiva for a do paciente e da família, e uma das drogas tiver benefício em diminuir o comportamento agressivo contra os familiares, mas mantenha os mesmos sintomas psicóticos, então, o tratamento que diminuir o comportamento agressivo poderá ser mais custo-efetivo se causar menos sofrimentos e custos para a família. 

A maioria das doenças mentais causa custos indiretos (custos que recaem em outros setores da sociedade que não os serviços de saúde). Para se verificar se um tratamento é custo-efetivo, muitos estudos só levam em conta os custos com os serviços de saúde. Quando estes estudos adotam estas perspectivas, eles deixam de analisar benefícios adicionais para o paciente, familiares e outros setores da sociedade.

A escolha da perspectiva mais abrangente é a da sociedade, mas, em geral os gestores públicos repudiam a mensuração de custos indiretos. Porém, a maioria das intervenções em Saúde Mental tem impacto em diminuir os custos indiretos.  Porém, não há consenso sobre qual é a melhor decisão a tomar para não sobrecarregar os custos da área da Saúde (Shearer et al, 2017). O custo com o cuidado informal (Wheatherly et al 2017, realizado por cuidadores e família é extremamente relevante e deveria ser levado em conta na análise dos tratamentos, principalmente, pelos custos (gastos catastróficos, perda de renda) que uma doença mental pode acarretar. Familiares cuidadores de pessoas com Demência perdem renda e trabalho por causa do cuidado informal. Este é um custo invisível e qualquer tratamento que produza um benefício em evitar o impacto deletério na renda e na saúde do cuidador precisa ser considerado. 

Na Economia da Saúde, um benefício tem que ser relevante para a saúde e bem-estar do paciente (e isso inclui outros aspectos que não a eficácia para alguns sintomas clínicos). Ou seja, não basta produzir um efeito, este efeito tem que modificar a qualidade de vida do paciente. O conceito de benefício está relacionado ao seu valor, à sua importância na vida do paciente. Em Saúde Mental, há muita dificuldade em se escolher qual o benefício mais relevante a se medir: sintomas clínicos, qualidade de vida, autonomia, etc. Geralmente, é um conjunto de benefícios (desfechos) que impactam de fato na vida do paciente (Razzouk,2017).

Portanto, uma avaliação de custo-efetividade de um tratamento que adote uma perspectiva muito restrita que não avalie os benefícios relevantes e os custos para a família podem não impactar de fato na saúde do paciente. Estes estudos, isoladamente, são insuficientes para a tomada de decisão de alocação de recursos e para o desenho de políticas públicas. 



Leitura complementar:

Weatherly,H et al. Quantifying informal care for Economic evaluation in Mental Health. In: Razzouk, D . Mental Health Economics: The costs and benefits of psychiatric care. Springer, Cham, 2017. ​http://www.springer.com/br/book/9783319552651

Shearer, J. et al. Reflections on the NICE decision to reject patient production losses. International Journal of Technological Assessment in Health Care 33, Issue 6 2017 , pp. 638-643  https://doi.org/10.1017/S0266462317000952https://www.cambridge.org/core/journals/international-journal-of-technology-assessment-in-health-care/article/reflections-on-the-nice-decision-to-reject-patient-production-losses/E7796513B8D6C251329414A0A3EEEBB0

Razzouk, D Outcome measurement for economic evaluation. In Mental Health Economics: The costs and benefits of psychiatric care. Springer, Cham, 2017. ​http://www.springer.com/br/book/9783319552651

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    Prof Dra Denise Razzouk

    Psiquiatra e professora universitária, com pós-doutorado em Economia da Saúde Mental. 

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