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Economia e Saúde Mental em Pauta​

Custo-Benefício de novos tratamentos: Novos medicamentos são melhores do que os antigos?

20/11/2017

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​Todos os dias novas medicações e tratamentos são lançados no mercado e com elas, a esperança de cura de doenças complexas se renova. Quem já teve a oportunidade de ler os estudos publicados pelas indústrias farmacêuticas sempre encontra resultados promissores em suas análises e, em geral, concluem que seu medicamento é mais custo-efetivo do que os demais!

A partir daí, pacientes e médicos seguem, frenéticamente, para testar estes novos tratamentos. É interessante observar o entusiasmo de alguns médicos que relatam, felizes, a melhora instantânea de seus pacientes nas primeiras semanas de uso, porém, quando aparece um novo tratamento, eles desprezam esta medicação e rumam para a próxima novidade, como se fosse uma nova versão de um iphone. Muitas medicações chegam ao mercado com poucas ou insuficientes testagems, e somente após alguns anos é que nos deparamos com os efeitos negativos e deletérios de algumas medicações. Quem ler uma bula, verá a infindável lista de efeitos colaterais e de uma frase adicional: "este medicamento é novo e efeitos colaterais desconhecidos podem ocorrer". 

Com a Internet, muitos pacientes se sentem seduzidos pelos novos tratamentos, sem ao menos ter noção se o efeito prometido é real. Chegam aos consultórios solicitando a nova medicação sem saber se esta é adequada para o seu caso.  A mais recente comoção pública foi com o episódio da fosfoetanolamina, aprovada para venda pela presidente à revelia das recomendações científicas. Posteriormente, ficou provada a sua ineficácia no câncer e mesmo assim, ela foi liberada para venda como suplemento nutricional. Muitas pessoas ficaram furiosas com a demora em comercializar tal medicamento e muitas queriam que ela fosse fornecida pelo SUS. 

No meio de tanta discussão acirrada e de tanto desconhecimento, a tomada de decisão de incluir tal medicação ignorou dados técnicos importantes: eficácia, segurança, custo-efetividade e custo-benefício, custo de oportunidade e equidade. Muitos nomes complicados, mas, vamos entender cada um deles.

O termo eficácia significa que a medicação é capaz de produz o efeito esperado e de que seu efeito é maior do que o de um placebo ou do que não fazer nada. Ou seja, o primeiro passo quando testamos uma medicação é saber se ela realmente é capaz de produzir um determinado efeito.  O segundo passo é saber se a medicação é segura, isto é, não causa danos maiores à saúde e à vida das pessoas. O outro passo é saber em quem e em que situações esta medicação funciona.

A última fase é comparar esta medicação com as já existentes no mercado para sabermos se seu efeito é melhor, igual ou pior. É nesta fase que testamos o custo-efetividade, isto é, comparamos os efeitos de duas medicações e de seus custos. Vamos imaginar duas medicações para abaixar a febre (uma nova e outra antiga). As duas conseguem abaixar a febre igualmente, porém, a medicação nova baixa a febre 3 minutos mais rápido do que a medicação antiga. Porém, o seu custo é três vezes maior do que a medicação antiga (R$90,00 x R$30,00). Para sabermos se ela é custo efetiva teremos que ver a diferença entre os custos (R$90,00- R$30,00= R$60,00) e a diferença do tempo de ação (3 minutos). O cálculo de custo efetividade se dá pela dividão entre a diferença dos custos e dos efeitos: 

CE= R$60,00/ 3 minutos  = R$20,00/minuto

Então, a medicação nova será custo efetiva se você estiver disposto (a) a pagar R$20,00 a mais para cada minuto que ela baixa a febre mais rápido do que a outra.

Vale à pena pagar R$20,00 a mais por minuto? A resposta é depende da relevância, da necessidade e possibilidade de pagar por esse efeito adicional. 

Uma medicação nova pode ser igualmente eficaz, mas ser muito custosa. E para se pagar mais é necessário saber em que a droga nova é melhor e se vale à pena pagar por este efeito. Também, precisamos saber de seus danos (custos), por exemplo, uma medicação inibe os sintomas psicóticos mas provoca obesidade e diabetes. 

O valor e relevância do efeito da medicação pode ser medido de várias maneiras. No custo-benefício este "valor" é medido em unidades monetárias (R$) enquanto no custo-utilidade este valor é medido em quantidade e qualidade de vida (QALY). Voltaremos a estes conceitos em posts futuros.

Mesmo que um efeito seja relevante é necessário verificar as consequências da aquisição de uma nova medicação no sistema público de saúde e de quantas pessoas podem se beneficiar e se é compatível com o orçamento. Por exemplo, imaginando que uma medicação para câncer prolongue em 4 meses a vida de uma pessoa em estágio terminal, o montante de recursos destinados para aumentar 4 meses de vida deixariam de ser usado para salvar a vida de outras. É uma decisão difícil. Mas, é necessário avaliar o custo de oportunidade, a equidade e o impacto orçamentário. Falaremos disso, em breve.






Referências

Razzouk, D. Why there needs to be some consideration of health economics in clinical decision making: The views of a clinician https://nwww.findeconjobs.com/pages/8130-why-there-needs-to-be-some-consideration-of-health-economics-in-clinical-decision-making-the-views-of-a-clinician


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O CUSTO DA INDIFERENÇA: A DOENÇA MENTAL NÃO ME ATINGE!

13/11/2017

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No último post, falei sobre o conceito de custo de oportunidade, isto é, o quanto nos custa cada decisão e escolha. Hoje, quero discutir o quanto nos custa ignorar a doença mental. Em outras palavras, eu me refiro aos efeitos invisíveis da doença mental para toda a sociedade, com particular ênfase à resistência em investir no tratamento, prevenção e cuidado das pessoas com doença mental e de suas respectivas famílias.  Esta resistência está presente em todos os setores da sociedade: o ESTIGMA contra qualquer pessoa que tenha um diagnóstico de doença mental!

Muitas pessoas acham que a doença mental só acontece nos outros, e de preferência, em alguém desconhecido de seu meio de relacionamento. Outras acreditam que tudo é um problema passageiro pela rotina difícil ou ainda, que algumas pessoas têm a “cabeça fraca”, ou seja, depende da vontade do indivíduo em superar os problemas. Poderia ficar listando centenas de outras concepções sobre as doenças mentais, mas, o que quero destacar aqui é o quanto a ignorância sobre este tema, juntamente com o estigma favorecem para que os efeitos negativos de uma doença mental sejam ainda maiores para toda a sociedade.
 
A doença mental custa para o mundo vários trilhões de dólares por ano! E a maior parte deste custo não se deve ao tratamento, mas ao que chamamos de externalidades (negativas, neste caso) e de custos indiretos (os custos que não são ligados ao tratamento e aos serviços de saúde)!

Vamos entender, primeiro, o conceito de externalidade. Se uma pessoa contrai uma infecção que seja transmitida por via respiratória (“pelo ar”) e usa um transporte público, ela poderá infectar outras pessoas. Se esta pessoa se trata ou usa, por exemplo, uma máscara na face, ela evita que outras pessoas se infectem. Se ela não se tratar e infectar outras pessoas, temos uma externalidade negativa (“spillover effect” um efeito que recai em terceiros, sem a participação deste). Se a pessoa se tratar e evitar que outras pessoas contraiam a infecção, temos uma externalidade positiva, ou seja, as outras pessoas vão se beneficiar pelo fato de uma única pessoa se tratar. No caso das infecções, é muito fácil entender este conceito. Quando o Estado provê vacinas para a população, ele evita uma externalidade negativa e, também, diminui o custo de oportunidade (se não vacinar, muitas pessoas podem morrer de infecção e isto seria um custo alto para toda a sociedade).
​
Portanto, quando decidimos não investir no tratamento e prevenção de doenças mentais, temos um alto custo de oportunidade, isto é, as doenças mentais causam tantas externalidades negativas, que o custo de não tratá-las supera o custo do tratamento. Vamos aos dados.

A depressão, por exemplo, constitui atualmente uma das principais causas de absenteísmo (falta no trabalho) e de auxílio doença (afastamento do trabalho). No Brasil, a depressão já é a terceira causa de afastamento do trabalho (Veja o artigo Por que o Brasil deveria priorizar o tratamento da depressão?).

Então, quando alguém fica deprimido, seu raciocínio e pensamentos ficam lentos, sua memória falha, sua concentração falha e o seu desempenho em suas atividades habituais fica pior. Além disso, a pessoa fica desmotivada, desinteressada pelas pessoas ao seu redor, pelo seu trabalho e mesmo, pelas suas atividades de lazer. A sua saúde física piora, pois alimenta-se mal, dorme pouco, fica inativo e chega a pensar em suicídio. Quem sofre com isso? O indivíduo? Com certeza! Mas, também, a família, os colegas de trabalho ou da escola (se for o caso), a empresa em que trabalha e o país (em caso de auxílio-doença, aposentadoria precoce ou de morte precoce).

Portanto, uma das externalidades negativas da depressão é a improdutividade no trabalho (veja no livro gratuito Saúde Mental e trabalho, editado pelo CREMESP). Mas, uma mãe com depressão pode ter dificuldades para cuidar de seu bebê, e este vai ter problemas em seu desenvolvimento físico e mental pelo menos nos primeiros três anos de vida! Pesquisas recentes mostram que uma criança quando privada de alimentação e estímulos cognitivos adequados não vai atingir o máximo de potencialidades mesmo que após este período se forneça alimentação adequada para suprir esses prejuízos. Ou seja, a depressão pode prejudicar, não apenas o presente, mas, o futuro de uma criança. Então, a doença da mãe produziria uma externalidade negativa na vida da criança.
 
Onde está a indiferença? A maior parte da indiferença está nas políticas públicas de saúde em não reconhecer a saúde mental como uma prioridade, ou melhor, em não investir de fato para tratar e prevenir as doenças mentais. As políticas públicas de saúde, mundialmente, focam na saúde da mãe e no índice de mortalidade infantil, mas, em geral, não priorizam as doenças mentais. O foco, em geral, se concentra na saúde reprodutora, no combate às infecções e traumas de parto, no controle da desnutrição. Porém, a violência, o alcoolismo, o uso precoce de drogas, a ansiedade e depressão, tanto das crianças como daqueles que as cercam impactam a vida de gerações. Este impacto é invisível aos olhos da sociedade!
 
Nem tudo é óbvio quando se trata de doença mental! Seus efeitos são invisíveis e duradouros. Quando ocorre um acidente, um desastre natural, uma guerra ou qualquer evento traumático, teremos efeitos na saúde mental de uma ou mais gerações. Os efeitos são crônicos e nem sempre aparecem imediatamente após os eventos. Podem levar meses, anos e décadas.

As doenças mentais podem levar ao empobrecimento do indivíduo ou da família por perda de renda, por dificuldade em se manter ou conseguir um emprego. Também aumentam a chance de morrer por acidente, uso de drogas ou álcool, suicídio e por outras doenças físicas.

Infelizmente, apesar de todos estes efeitos nocivos das doenças mentais, a sociedade, ainda, se esquiva em enfrentar este tema. É como se isto estivesse distante, que só ocorresse com os outros, ou como se não existisse. A indiferença não está apenas no Estado, está nas pessoas, também.

Um estudo realizado por Smith e equipe mostou que pessoas do público geral reconheciam que as doenças mentais causavam um maior impacto negativo do que as doenças físicas, mas, elas preferiam que os recursos públicos de saúde fossem destinados 40% mais para a saúde física do que para a saúde mental!

O Prof Thornicroft, do King´s College, um grande líder em saúde mental e estigma,  mostrou que a maioria das empresários entrevistados referia que não existiam pessoas com doenças mentais em suas corporações ou que esta taxa seria insignificante. Ele aponta que o comportamento de discriminação e estigma se originam da ignorância! Ao contrário do que pensavam os empresários do estudo, a frequência de doenças mentais nas empresas pode ser maior do que 20-30 % dos funcionários,  como tem sido mostrado em vários estudos internacionais.

Muitas vezes, estas pessoas perdem emprego, são rejeitadas ou sofrem bullying porque não são bem aceitas no ambiente ocupacional. Então, o estigma, também, prejudica a inclusão destas pessoas no trabalho e na vida em sociedade.

A grande questão é: o que fazer em relação às doenças mentais?

A primeira etapa é reconhecer que as doenças mentais existem da mesma forma que existem doenças físicas e de que não é uma vergonha ter uma doença mental. O maior desafio é, sem dúvida, combater este estigma. A mesma seriedade e cuidados que se têm para tratar e evitar um infarto cardíaco têm que ser destinados para cuidar das pessoas com doenças mentais ou com risco de adoecimento.

A outra etapa essencial é a questão do investimento público e privado na prevenção e tratamento das doenças mentais. Na maioria dos países, como no Brasil, não há um orçamento específico destinado para a saúde mental. Isto dificulta muito o planejamento e a transparência nas ações necessárias de cuidados. Muito países de baixa e média renda destinam menos de 2% do orçamento da saúde para a saúde mental, apesar das doenças mentais afetarem 1 pessoa em cada 4!
 
Além do investimento, é essencial estabelecer prioridades, metas e avaliações da qualidade de tratamento em saúde mental para uma política pública de saúde eficiente.

A boa notícia é de que há meios de prevenir os riscos para doença mental e há tratamentos eficazes para a maioria das doenças mentais. Então, é possível, com o tratamento,  que a pessoa se recupere e tenha uma boa qualidade de vida e com capacidade de ser produtiva e de participar ativamente na sociedade. Ou seja, a prevenção e o tratamento transformam uma externalidade negaativa em positiva!
 



Quem tiver interesse na leitura  no tema:


Smith DM, Damschroder LJ, Kim SY, Ubel PA. What’s it worth? Public willingness to pay to avoid mental illnesses compared with general medical illnesses. Psychiatr Serv. 2012;63(4):319–24. See also: http://sb.cc.stonybrook.edu/news/general/040512MentalIllness.php
 
Thornicroft, G. https://www.kcl.ac.uk/ioppn/depts/hspr/research/ciemh/cmh/research-projects/sapphire/graham-thornicroft.aspx
 
Razzouk, D Burden and indirect costs of mental disorders. – Chapter 25. In: Razzouk, D (eds)  Mental Health Economics: The costs and benefits of psychiatric care. Springer International  Publisher, 2017 (http://www.springer.com/br/book/9783319552651)
 
 
Romeo R et al The economic impact of mental health stigma. – Chapter 27  In: Razzouk, D (eds)  Mental Health Economics: The costs and benefits of psychiatric care. Springer International  Publisher, 2017 (http://www.springer.com/br/book/9783319552651)
 
Razzouk, D; Cordeiro, Q; Aranha,M. Saúde mental e trabalho. Cremesp, 2016. Dowload: http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Publicacoes&acao=detalhes&cod_publicacao=79

Razzouk, D Por que o Brazil deveria priorizar o tratamento para a Depressão? Epidemiologia e Serviços de Saúde, 2016 Download: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2237-96222016000400845
 
 

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    Prof Dra Denise Razzouk

    Psiquiatra e professora universitária, com pós-doutorado em Economia da Saúde Mental. 

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