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Economia e Saúde Mental em Pauta​

Suicídio entre os jovens:o custo invisível do sofrimento!

23/4/2018

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Há vários relatos na mídia, nos relatórios da OMS e nos dados do Ministério da Saúde sobre o crescimento na taxa de suicídios no Brasil, principalmente, entre os mais idosos e entre os jovens. Enquanto que a média nacional de suicídios gira em torno de 5,5 por 100 mil habitantes, entre os idosos com mais de 70, esta taxa alcança 8,9 por 100 mil e entre os jovens de 15 a 29 anos, esta taxa é de 9 por 100 mil. Dentre os jovens, os estudantes e residentes de Medicina da tem sido apontados como um grupo vulnerável ao suicídio. Em 2017, 6 suicídios ocorreram entre os estudantes de Medicina da USP. Nesta semana, a notícia de que dois estudantes do ensino médio do Colégio Bandeirantes cometeram suicídio em um período de 15 dias volta às manchetes nacionais. 


Há muita especulação e desinformação sobre o tema seja entre as notícias veiculadas na mídia ou entre os comentários do público leigo nas redes sociais. Muitas vezes, as pessoas tentam explicar as causas do suicídio como sendo relacionadas ao excesso de estresse, à falta de amor, à falta de dinheiro, às más condições sócio-econômicas de vida e à negligência parental. Com certeza todos estes fatores exercem um peso em relação à motivação de alguém querer cometer o suicídio. Porém, o que é invisível para a maior parte das pessoas é que 90% das causas do suicídio estão relacionadas aos transtornos mentais. A depressão, a ansiedade, o uso de substâncias (álcool e drogas) e as psicoses constituem as principais causas de suicídio e acometem os jovens, principalmente, no final da adolescência e início da idade adulta. Os jovens são, portanto, um grupo de alta vulnerabilidade para problemas emocionais e psiquiátricos. 

O sofrimento produzido pelos transtornos mentais é enorme e constitui o que se denomina de custos intangíveis (que não é passivel de mensuração), no jargão da Economia da Saúde. Além disso, a morte precoce ou a abreviação deliberada da vida representa um alto custo para a sociedade (custos indiretos). Porém, o que permanecem invisíveis são os sinais que o adoencimento mental emite antes da ocorrência do suicídio. Dentre os sinais precoces estão o isolamento social, a diminuição de performance no trabalho e na escola (perda de ano letivo), a diminuição da memória, insônia, a dificuldade para alimentar-se. a dificuldade de comunicação e de relacionamento, a ingestão contínua de álcool e drogas ou medicamentos para dormir e mudanças de comportamento. As pessoas notam estes sinais, mas não os atribuem às doenças mentais. Em geral, encontram uma causa relacionada aos problemas do dia a dia. Por outro lado, muitos profissionais de saúde, também, não reconhecem estes sinais a tempo de identificar um diagnóstico e realizar um tratamento. As políticas públicas de saúde mental são tímidas no que tange a instrumentalizar os profissionais de saúde e o publico em geral (educadores, pais, líderes religiosos, etc) sobre a identificação de um problema mental em potencial (rastreamento) e o devido encaminhamento para um profissional habilitado. 

O suicídio é a consequência, é o custo de não cuidar da saúde mental das pessoas. As pessoas se assustam e sente-se, naturalmente,  chocadas quando um suicídio ocorre, mas, após algumas semanas ou meses, tudo cai no esquecimento, até um novo evento. O problema da saúde mental não é apenas uma questão de saúde, é uma questão da sociedade como responsável pelos cidadãos. As escolas, as empresas, os governantes, os pais, os líderes de opinião tem um papel decisivo para diminuir os custos invisíveis dos problemas mentais. Políticas públicas preventivas, acesso a tratamento adequado, informação de qualidade, suporte emocional para os indivíduos e famílias (no trabalho e escolas), identificação precoce e acompanhamento dos grupos mais vulneráveis são algumas ações possíveis para minimizar os custos gerados pelas doenças mentais. Em termos econômicos, os custos do suicídio representam uma significante parcela do PIB (1% na Irlanda), mas em termos sociais e individuais, o custo é imensurável. Vários países tem adotado estratégias para prevenir o suicídio, sendo que a principal medida é rastrear e tratar as doenças mentais e combater os fatores de risco (Vasiladis et al, 2015; UK Parliament, 2016, Lewitza, 2015). A meta da OMS é reduzir em 10% a taxa de suicídio até 2020 e o Brasil está alinhado a esta meta e iniciou algumas estratégias de treinamento no tema entre profissionais de saúde. Porém, há o muito o que fazer e todos os setores da sociedade podem contribuir.


Leitura complementar

Vasiladis et al, Implementing Suicide Prevention Programs: Costs and Potential Life Years Saved in Canada. J Ment Health Policy Econ 2015. 18:3:147-155.


 UK Parliament. Services to support people whoo are vulnerable to suicide.  https://publications.parliament.uk/pa/cm201617/cmselect/cmhealth/300/30005.htm

Lewiztka, U. Suicide prevention- it is everybody´s business. BMC Psychiatry ​2015 https://blogs.biomedcentral.com/bmcseriesblog/2015/05/29/suicide-prevention-everybodys-business/

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Qual o valor da saúde mental?

10/4/2018

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Desde o início deste Blog, eu tenho insistido que a Economia foca nas decisões e nos valores de uma sociedade em relação ao uso e distribuição dos recursos escassos para satisfazer as suas necessidades. No caso da Economia da Saúde, a grande discussão se direciona em definir e mensurar o valor da saúde nas diferentes perspectivas. Ao determinar o valor da saúde, segue a discussão sobre o quanto de recursos estamos dispostos a disponibilizar afim de obtermos o maior ganho de saúde possível. 

Na Economia da Saúde, o ganho em saúde é mensurado tanto em quantidade (aumentar expectativa de vida) como na qualidade de vida (diminuir uma deficiência ou recuperar totalmente a saúde). Dentre as possibilidades em se medir o ganho em saúde, destaca-se o QALY (Quality -Adjusted Life Years), um indicador que mensura, simultaneamente, o ganho em saúde tanto em quantidade como em qualidade de vida. Um QALY representa um ano de saúde perfeita. 

A medida do QALY é obtida através da identificação e quantificação das preferências dos indivíduos em relação aos tratamentos e aos estados de saúde. Uma das técnicas para se verificar a preferência é o standard gamble, através do qual o  indivíduo expressa suas escolhas, variando-se a probabilidade de morte, diante de um cenário de possível cura ou morte com um determinado tratamento. Quanto maior for a preferência, maior será o valor QALY. Mas, será que as preferências sempre estão direcionadas ao ganho de saúde? Provavelmente, não. São vários os fatores que interferem nas preferências dos indivíduos, mas, antes tudo, as preferências estão relacionadas aos valores individuais e aos da sociedade. (Garrinson et al., 2017)

Discute-se muito na literatura de Economia da Saúde sobre a preferência  das pessoas para que as políticas públicas financiem tratamentos para aqueles doentes mais graves, com maior risco de morte e com maior grau de vulnerabilidade (pobreza), independentemente do quanto um tratamento é eficaz, custoso ou das necessidades epidemiológicas da população. Por outro lado, sendo o sistema de saúde de cobertura universal ou privado, o que passa a ser relevante para a saúde da população pode se contrapôr à saúde do indivíduo (Garrinson et al, 2018). A perspectiva do gestor público, do provedor do serviço privado e do paciente são bem diferentes quanto ao que considerar mais relevante em termos de valor (Perfetto et al, 2017).

Se há divergências entre o entendimento do que é um ganho valioso em saúde (Sha et al., 2012; Garrinson et al, 2018), na saúde mental este cenário é ainda mais nebuloso. Todo mundo quer ser saudável e ter acesso a tratamento, porém, pouco se discute a cerca das consequências para a sociedade de tais preferências. Atualmente, há um movimento em prol da promoção do bem-estar e da saúde mental, porém, quais são as preferências da população para o tratamento e cuidado das pessoas com doenças mentais? O que significa ganho em saúde mental?

Enquanto que em muitas especialidades médicas, o ganho em saúde seja direta ou indiretamente quantificado pela eliminação de sintomas físicos,  recuperação da autonomia física e prolongamento da vida, a delimitação do que é um ganho em saúde mental é bem mais complexa (Razzouk, 2017).

Recentemente, no Value in Health de fevereiro 2018, vários autores trouxeram discussões interessantes sobre o valor da saúde e dos elementos que podem ser considerados para que os gestores incluam ou não um tratamento no serviço de saúde. Estes autores propuseram uma série de componentes baseados nas preferências dos indivíduos, mas nenhum dos elementos elencados eram relacionados com a saúde mental. 

Quando uma pessoa apresenta uma doença mental ela perde muito mais do que a sua saúde. Ela perde o emprego, oportunidades, relacionamentos, direitos civis e muitas vezes, os direitos civis, a liberdade de escolha e a capacidade de gerir a sua própria vida. Os tratamentos permitem que estas pessoas não apenas se livrem do sofrimento dos sintomas mentais, mas, também, recuperem suas vidas, globalmente. O maior ganho em saúde mental é conseguir gerenciar a própria vida, resgatar sua autonomia como pessoa e exercer um papel na sociedade. Mas, este ganho é invisível. Não há ganho em saúde mental sem investimento em tratamento e nos cuidados destas pessoas. 

Os estudos sobre preferências em relação às doenças mentais mostram claramente o estigma e o pouco valor que muitas pessoas dão ao tratamento das doenças mentais e às pessoas que necessitam destes cuidados. As técnicas usadas em Economia da Saúde, dificilmente, capturam todo o benefício dos tratamentos das doenças mentais. Isto se reflete na quantidade e forma como os recursos são alocados para a Saúde Mental. 

Há muito o que se discutir sobre o valor da saúde, mas é necessária uma discussão mais detalhada sobre valor da saúde mental. Os instrumentos disponíveis para mensurar os ganhos em saúde mental concentram-se na alteração da quantidade dos sintomas mentais, na melhora da funcionalidade de um modo global. Apesar do QALY ser utilizado na Saúde Mental, há vários problemas com esta medida para aferir o valor do ganho em saúde mental. Ainda que seu  valor seja reconhecido, haverá repercusão no montante investido em saúde mental? A equidade é, frequentemente, defendida como um modo de prover os serviços de saúde de uma forma mais justa, dando igual acesso às pessoas de maior vulnerabilidade econômica. As pessoas com doenças mentais também apresentam alta vulnerabilidade quanto às perdas de oportunidade, de desempenho social, econômico e psicológico. O que falta para que o valor da saúde destas pessoas seja considerado? O que faz um sociedade ser solidária apenas com um determinado tipo de adoecimento e sofrimento?

 

​Leitura complementar

Garrinson LP et al. Toward a Broader Concept of Value: Identifying and Defining Elements for an Expanded Cost-Effectiveness Analysis. Value In Halth 2017; 20:213-216.


Perfetto et al Value to Whom? The Patient Voice in the Value Discussion. Value in Health 2017; 20:286-291.

Razzouk, D. Mental Health Economics: The costs and benefits of psychiatric care. Cham, Springer International Publishing, 2017.


Shah, K., Praet, C., Devlin, N., Sussex, J., Appleby, J. and Parkin, D. Is the aim of the English health care system to maximize QALYs? Journal of Health Services Research & Policy, 2012;17(3), pp.157-163. ​https://www.ohe.org/publications/aim-health-care-system-maximise-qalys-investigation
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    Prof Dra Denise Razzouk

    Psiquiatra e professora universitária, com pós-doutorado em Economia da Saúde Mental. 

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